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sexta-feira, 1 de novembro de 2013

O Capitalismo é Moral?


 O Capitalismo é Moral

André Comte-Sponville, filósofo francês



 
A conclusão de Sponville é de que o sistema não é moral nem imoral: o capitalismo tem sua lógica interna, que é de ordem diferente da moral. Enquanto a moral pergunta o que é certo e o que é errado, o capitalismo tenta responder o que é mais eficiente, mais lucrativo. Para ele, resta a nós tornar a sociedade capitalista mais justa. Em entrevista por e-mail, o filósofo explicou seus pontos de vista.

A sua palestra sobre capitalismo parece aborrecer um bocado de pessoas. Especialmente empresários parecem escandalizados quando ouvem que o capitalismo “não é moral”. Por que isso acontece?

Porque seria mais confortável para eles pensar o contrário! Se o capitalismo fosse moral, os diretores de empresas fariam o trabalho mais belo do mundo: eles criariam virtude ao mesmo tempo que riqueza, eles cuidariam de sua saúde ao mesmo tempo que fariam sua fortuna. Não é de espantar que eles queiram acreditar nisso! 


É preciso dizer que essas questões me foram propostas sobretudo pelo mundo empresarial, onde os dirigentes, porque isso lhes convém, estão massivamente convencidos de que o capitalismo é moral.

Eles também me acharam muito severo com nosso sistema econômico. Na esquerda (falo disso na nova edição de meu livro, com um longo posfácio inédito, que não sei se já foi publicado no Brasil), é antes o inverso: as pessoas estão convencidas de que o capitalismo é imoral, e me reprovam de ser indulgente demais com ele! Isso não prova que eu tenho razão, mas salienta a singularidade de meu ponto de vista.

O que mostro em meu livro é que o capitalismo não é moral: ele não funciona para a virtude, a generosidade ou o desinteresse, mas, ao contrário, para o interesse pessoal ou familiar. 
Digamos a palavra: o capitalismo funciona para o egoísmo.

 É por isso que ele funciona tão bem (o egoísmo é a principal força motora) e é por isso que ele não (nunca) é suficiente! O egoísmo é formidável para criar a riqueza, mas isso nunca foi suficiente para fazer uma civilização, nem mesmo uma sociedade que seja humanamente aceitável . Então o capitalismo não é moral. Ele é imoral? Tampouco. Ocupar-se de seus interesses e dos de sua família não é um erro! Querer ganhar dinheiro, contanto que se respeite a lei, não é proibido! Não tenhamos medo de dizer: o egoísmo faz parte dos direitos do homem.

 O capitalismo não é, portanto, nem moral nem imoral: ele é amoral, dando ao prefixo “a” seu sentido puramente privativo (de privação). Não conte com o mercado para ser moral no seu lugar, nem com a moral para criar riqueza!

O senhor defende que após a queda da União Soviética o capitalismo não podia mais se justificar como uma oposição a outro sistema e que algumas pessoas tentaram justificá-lo dizendo que o sistema é “bom” e “moral” em si mesmo. O senhor compara isso a um processo religioso. Como está essa situação hoje?

A União Soviética era uma contraposição que valorizava o capitalismo. Desde que essa contraposição se dissolveu, o capitalismo tenta encontrar uma justificativa interna: ele seria o triunfo da liberdade, do esforço, do mérito, da criatividade... Uma espécie de paraíso sobre a terra! Os pobres julgarão. A verdade é que o capitalismo é um sistema economicamente eficaz, ecologicamente perigoso e moralmente injusto.


Evidentemente, tudo seria mais simples se a moral, a economia e a ecologia andassem sempre na mesma direção. Mas graças a que milagre tal coisa aconteceria? A única maneira de articular essas três dimensões é fazer política! Isso passa pela militância, mas também pelo governo, o Parlamento e o direito.

Se a economia fosse moral, não teríamos necessidade de Estado. Não é esse o caso. É por isso que temos necessidade de política. Os bons sentimentos jamais foram suficientes para ganhar uma eleição e ainda menos para governar de forma eficaz!

O senhor defende que, se nós não podemos contar com o capitalismo para ser moral, nós precisamos fazer as coisas serem morais nós mesmos. Isso pode ser feito por meio de políticas sociais e de redistribuição de renda? Nesse sentido, o modelo social-democrata de países nórdicos como a Suécia é mais “moral” do que o modelo de capitalismo dos EUA?

Não estou aqui para distribuir boas e más características, nem para dar certificado de moralidade a uns ou outros! Sou um social-democrata: politicamente sinto-me portanto muito mais próximo do modelo escandinavo do que do modelo americano. Mas cuidado para não confundir o combate político, que opõe partidos e ideologias, com um combate moral, que oporia os bons e os malvados. É verossímel que (o economista liberal Friedrich) Hayek, por exemplo, tivesse respondido que ele prefere o modelo americano.


Não vejo em nome de qual superioridade moral ou intelectual eu pretenderia que a virtude está no meu campo mais que no seu! A moral não é nem de direita nem de esquerda. É por isso que a esquerda e a direita necessitam dela. Quanto à política de redistribuição, sou favorável a ela, e a princípio por questões morais. Isso não me autoriza a condenar moralmente aqueles que querem limitá-la ou reduzi-la.

 Com o tempo, o problema é mais de saber se a redistribuição é moral (poucas pessoas o contestam) do que se ela é eficaz. Fazerem os ricos pagarem para ajudar o pobres? Moralmente, só posso ser a favor. Exceto quando a pressão fiscal faz os ricos fugirem ou quando ela mutila a economia: nesse caso os pobres são os primeiros a sofrer. É onde a política encontra seus direitos e suas proibições. 

A moral não substitui lucidez, nem competência, nem eficácia. “Ser de esquerda”, dizia Coluche, “não dispensa (a necessidade de) ser inteligente”.

De todas as “liberdades” do capitalismo, a liberdade de acumulação é a mais criticada pela esquerda. A crítica é de que, se você pode ter tudo o que conseguir, e só o que conseguir, sempre há quem não consiga nada...

Sim!, o capitalismo é um sistema onde se pode enriquecer! É preciso lamentar isso? Não estou certo. Porque enfim, criar a riqueza é a única maneira de fazer recuar a pobreza.


O capitalismo é desigual? É verdade. Mas ele é formidavelmente eficaz, e, em um país governado corretamente, mesmo os pobres acabam por tirar proveito disso. Compare o destino da classe operária em 1850, em 1900, em 1950 e hoje.

Você verá que, na maior parte dos países, os progressos são consideráveis e, nesta escala de tempo, quase contínuos! Contrariamente àquilo em que frequentemente acreditamos, os ricos não precisam empobrecer os pobres.
 Ao contrário: quanto mais a pobreza recua, mais o comércio avança, e isso é bom para os ricos!

 O que me faz pensar no que me dizia um dia um amigo judeu: “Vocês, góis, são bizarros! Vocês creem que o problema é a riqueza. Mas nós, judeus, compreendemos há muito tempo que o problema não é a riqueza, é a pobreza!” No fundo, até que estou de acordo. Alguns, à esquerda, dão a impressão de que não ficarão contentes enquanto ainda haja ricos. Mas todo mundo ficar pobre, seria realmente um progresso? Uma política de esquerda eficaz, do meu ponto de vista, não é aquela que diminui a riqueza, é a que faz recuar a pobreza.

Em outro livro (Bom Dia, Angústia!), o senhor escreveu que nós pensamos no mandamento de Jesus de não termos dinheiro apenas como uma metáfora porque preferimos (ou precisamos) pensar deste jeito. Na sua opinião, a riqueza pessoal é “imoral”?

A questão moral não trata do dinheiro que ganhamos (ter um salário bastante grande não é um defeito), mas do que fazemos com o dinheiro ganho. E quanto a isso, a resposta dos evangelhos é clara: tudo que não damos está perdido e nos perde. O que é imoral não é a riqueza, é o egoísmo. Isso coloca duas questões. A primeira concerne à moral: um rico que não fosse egoísta poderia permanecer rico por muito tempo? A segunda concerne à antropologia: um ser humano que não fosse egoísta seria um ser humano?

A crise financeira do Ocidente mudou algo na maneira como vemos o capitalismo? Mudou a maneira como as coisas são conduzidas?

Muitos economistas me disseram, nesses últimos meses, que meu livro, publicado em 2004, portanto muito antes da crise, era “premonitório”. Isso sem dúvida é um exagero, mas sugere que minhas análises foram mais confirmadas que desmentidas pela crise. Esta crise de fato nos lembra que o capitalismo é amoral, que ele é incapaz de se auto-regular de uma maneira social e moralmente aceitável, enfim, que a moral é também incapaz de regulá-lo. 

Conclusão: só o direito e a política podem regular eficientemente o capitalismo, submetendo-o a um certo número de coerções externas, o que volta a impor aos mercados um certo número de limites não comerciais “non marchand”: “serviço ou produto” cujo preço não depende do mercado (ex.: serviço público, doméstico)... talvez a melhor equivalência fosse “sem lucro e não lucrativo”, para “non marchande et non marchandables”. Há talvez, no economês, alguma expressão para algo que não possua, digamos, “mais valia”, como o serviço doméstico? e não comerciáveis.
 É o que os economistas chamam hoje de “o retorno dos Estados”, e é uma boa notícia. Falta encontrar regulações eficazes em uma economia mundializada: isso passa por uma política de escala mundial. É o que se busca no G20, na OMC, no FMI, ou recentemente em Copenhague. Cada um percebe as dificuldades desse processo, que são consideráveis, mas percebe também que não há outra via.

O senhor diz que há uma geração tentando substituir ações políticas por ações morais. Isso é ruim? Por quê?

Porque isso nos condena à impotência. Não tenho nada contra as ações caritativas ou humanitárias, muito pelo contrário. Mas se você contar com elas para transformar a sociedade, você está se enganando. A moral é uma coisa grande, certamente necessária, mas que não substitui a política!

O senhor diz que o erro de Marx foi submeter a economia à moral. E afirma que isso nunca podia ter funcionado. Isso significa que todos os tipos de socialismo estão condenados ao fracasso?

O que está fadado ao fracasso, para mim, é toda forma de política que pretendesse impor o reino da virtude, da generosidade ou do desinteresse, enfim, funcionasse para algo que não o egoísmo.


 Isso seria querer transformar a humanidade, o que é um sonho totalitário e louco. É em nome da virtude que Saint-Just e Robespierre impuseram o Terror! É em nome do “novo homem” que criou-se o goulag!

 Resta então inventar um socialismo lúcido, que não peça às pessoas para renunciar aos seus interesses, mas simplesmente ser egoístas juntas e inteligentemente (é o que chamo solidariedade) ao invés de estupidamente e uns contra os outros. Isso ainda é socialismo? Pouco importam as palavras.

 Digamos que é a versão reformista, liberal e sócio-democrata. É o que alguns, hoje, chamam de social-liberalismo, e a expressão não me incomoda nada.

O senhor realmente acredita que as empresas estão realmente enganando seus consumidores quando dizem que são empresas “morais” ou empresas “cidadãs”?

Por um lado, sim: isso faz parte da comunicação, da publicidade. Mas há também outra coisa: todo mundo prefere defender sua boa consciência. Tanto melhor se isso força nossas empresas a antes prestar contas dos interesses da coletividade.


 Dito isso, não sonhemos: depende do Estado, e não das empresas, dos cidadãos, e não dos patrões, transformar a sociedade! As empresas estão aí para criar riqueza; o Estado, para criar justiça. É por essa razão que precisamos de ambos!

A sua mensagem é que nós não podemos contar com o capitalismo para ser moral. Assim, é possível crer que ações governamentais podem tornar uma nação mais moral?

Nenhum país é moral: cabe aos indivíduos sê-lo. Por outro lado, há situações moralmente escandalosas (a opressão, a exclusão, a miséria), que um governo digno deste nome deve combater. Desde a crise falamos muito na França sobre “moralizar o capitalismo”. Tudo depende do que compreendemos dessa ideia.


 Se pretendemos tornar o capitalismo intrinsicamente moral, de forma que ele não funcione mais com o egoísmo mas com a virtude e o desinteresse, isso é evidentemente um desejo edificante, uma mentira e uma ilusão.

 Ao contrário, se compreendemos por “moralizar o capitalismo” a ideia de lhe impor um certo número de limites externos, então isso não somente é possível, não somente é necessário, como já o fazemos há bastante tempo.

 Quando proibimos o trabalho das crianças, quando garantimos as liberdades sindicais, quando criamos o imposto sobre o lucro e a seguridade pública, quando sancionamos os abusos das posições dominantes, etc, moralizamos o capitalismo, e isso se fez, cada vez, através da política e do direito. É uma lição para guardar.

 A política não está aí para fazer a nossa felicidade (nós, e não o Estado, devemos velar sobre ela), mas para combater a infelicidade. A tarefa é considerável: cada um, como cidadão, deve contribuir!

Tradução de Sandra Stropparo


Disponível em: http://www.gazetadopovo.com.br/cadernog/conteudo.phtml?id=1023485



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O CAPITALISMO É MORAL?


Veículo: Revista Carta Capital


FILOSOFIA, André Comte-Sponville não vê sentido na moralização do capitalismo

A DIEGO VIANA E GABRIELA LONGMAN, DE PARIS
O presidente da França, Nicolas Sarkozy, clama por uma “moralização do capitalismo” depois  da eclosão da crise financeira mundial. Mas seu compatriota,  André Comte-Sponville, acha que a reivindicação beira o ridículo.

Em 2005, a França e o Brasil (Martins Fontes) publicaram o livro do filósofo francês intitulado 
O Capitalismo É Moral? O ensaio recupera conceitos de Adam Smith e Montaigne para
argumentar que não há nada de moral na economia, nem de imoral.

A moralidade, por si,  não poderia controlar as relações de mercado, nem entre patrões e empregados, nem entre consumidores e vendedores. O livro, reeditado com muito sucesso na França  em 2009, sustenta que a economia não é o campo adequado para a moralização.

Nesta entrevista à Carta Capital, Comtte-Sponville interpreta a crise financeira como
o esgotamento do ultraliberalismo e aponta a urgência de, neste cenário, resgata a
política. Ele diz que o mercado produz riqueza, mas só o Estado, entidade
eminentemente política, produz justiça. A moral só age na sociedade por meio de leis
que bloqueiem os piores impulsos do capitalismo: monopólios, exploração do trabalho,
especulação. 

Definindo-se como social-democrata e realista, o filósofo crê que uma
política de sucesso deve contentar-se em administrar as diferenças, ou seja, em
evitar os males maiores.

Comte-Sponville é otimista sobre o futuro.
Vislumbra o nascimento de uma “civilização mundial” e a superação dos principais conflitos contemporâneos. 
Para isso, ele crê ,a humanidade precisará abandonar a fé em valores absolutos, em nome da política e da
moral.

Carta Capital: Faz sentido moralizar o capitalismo?

André Comte-Sponville: O que entendemos por “moralizar” o capitalismo? É torná-lo
intrinsecamente moral, movido não pelo interesse, mas pela generosidade? Isto é pura
ilusão. Já fixar limites externos, políticos e jurídicos para combater defeitos
morais não só é Possível e necessário, algo que se faz há 200 anos. Quando proibimos
o trabalho infantil, garantimos as liberdades sindicais ou impedimos abusos de
posição dominante, moralizamos o capitalismo. Sarkozy produz bravatas.
Asocial-democracia nada mais é senão aceitar a economia de mercado – a mais eficaz –
com limites externos.


CC: Os últimos vinte anos rejeitaram esse pensamento.

ACS: E, no entanto, a edição atual do meu livro é mais lida que a original. Os
economistas dizem se tratar de um livro premonitório. Não fiz previsões. A vantagem
do filósofo sobre o economista é não precisar delas. O que a crise confirmou foi a
amoralidade, não a imoralidade, do capitalismo. Depois, a incapacidade do mercado de
se regular de modo social e moralmente aceitável. A crise é uma autorregulação com
resultados deploráveis. E a moral tampouco é capaz de regular a economia. Se
contássemos com a moral dos financistas para organizar a sociedade, ainda estaríamos
no tempo do (escritor do século XIX Émile) Zola. Se o mercado é incapaz de se regular
e a moral incapaz de regular o mercado, o que resta? Só a lei e a política. A crise
confirma que os ultraliberais estavam errados. Num pais em que o Estado não toma
conta nenhuma da economia, o pleno emprego está garantindo apenas para os sobreviventes.

CC: A condenação do especulador Bernard Madoff foi recebida como um triunfo
moral.


ACS: Foi, mas a moral não é para julgar os outros, só legítima na primeira pessoa.
Para os outros, a lei basta. Madoff foi condenado. Eu me felicito como cidadão. Mas
não tenho condição de julgá-lo Só Deus, se existisse, estaria capacitado para isso.
Madoff é um canalha ou um bom sujeito? Provavelmente, ambos. A moral é julgar a si
mesmo e já dá um trabalho enorme. Juridicamente, ele tinha de ser punido. É preciso
não confundir política com moral. Um exemplo: eu soube da falência do Lehman Brothers
pelo rádio. O secretário do Tesouro americano recusou-se salvar o banco e ele
quebrou. Minha primeira reação foi dizer: “Bem feito! Vão pagar!” Hoje, os
economistas concordam que não salvar o banco foi o erro o século. Henry Paulson deve
ter tido razões morais para se reusar, pensando: “Safados! Especularam
vergonhosamente, agora quebrem!” Talvez por ótimas razões morais, tomou uma péssima
decisão política, social e econômica.


CC: Se grupos transnacionais forem mais fortes que os Estados, sobra lugar
para moral e política?

ACS: É preciso que os Estados impeçam os monopólios e eles têm as ferramentas para
isso, ao mesmo nos países ricos. Nenhuma empresa é mais forte que um Estado
desenvolvido. Se o povo americano quiser nacionalizar a Microsoft, pode. A França
quis nacionalizar os bancos, a esquerda assumiu o poder e o fez. Mas logo vimos que
eles funcionaram pior. Para criar riqueza, o mercado é mais eficiente. A dificuldade
para o Estado é cumprir o seu papel. Ele deve garantir, não gerir a economia. A
esquerda já renunciou à nacionalização. Entendeu que o Estado não é bom para gerar
riqueza. Agora, a direita precisa entender que o mercado não serve para criar
justiça. Precisamos do mercado para o que está à venda, e do Estado para o que não
está.


CC: A publicidade, ao usar a idéia utilitarista da busca pela felicidade,
seria uma resposta econômica à questão moral?

ACS: Sim, uma falsa resposta. A publicidade mente, pois nos diz que seremos mais
felizes com tal produto que sem ele. Meus filhos compraram cinco celulares nos
últimos anos e não são mais felizes por isso. A publicidade também é movida a
novidade, como se ela significasse tudo na vida.


CC: E isso acontece também na arte...

ACS: Toda época tem a arte que merece. A nossa é a do mercado triunfante e da
publicidade. Ambos se fundam sobre o novo. Na arte, a única forma de produzir o novo
é ser radical. O fim do processo é fazer obras sem sentido. A busca louca pelo novo
na arte é uma contaminação da lógica do capitalismo e da publicidade.


CC: Se a publicidade responde à moral, parece difícil criar algo à parte.

ACS: Claro. Por isso educamos as crianças. Se o capitalismo fosse moral, a
publicidade também seria. Não precisaríamos educar as crianças. Bastaria colocá-las
diante da tevê. Mas é bem o contrário. Temos de arrancá-las de lá para lhes ensinar
qualquer coisa. Não sou “publífobo”. A publicidade tem sua importância econômica. Mas um adolescente, hoje, pensa que a felicidade depende do que possui. 
É a mentira publicitária, amar a novidade, ser in, Mas o essencial está no longo prazo. Vale mais
ler Aristóteles e Montaigne que revistas da semana passada. Tudo nelas está defasado,
mas o essencial dos filósofos segue vivo. Prefiro uma velha verdade a uma nova
mentira.


CC: O senhor disse que não quer mais falar de moral. Qual vai ser o seu
próximo tema?

ACS: Vou me dedicar à reabilitação da política. Estávamos errados, nos anos 60 e 70,
de achar que ela podia tomar o lugar da moral e estamos errados hoje de achar que a
moral pode tomar o lugar dela.

Disponível em: http://www.lmf.com.br/detalhes_assessoria_destaquemidia.asp?id=179

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